o mensageiro dos ventos

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

(des)soneto ou soneto as avessas

Palavras, versos, poesia.

Todo o sentimento em exagero: o medo, o desapego,

a agonia

O corpo inerte, o beijo tácito

As línguas que, tão perto, não se tocam

Saboreiam o mesmo hálito

Um sorriso em desconcerto

E a cada estranheza, um nó, uma incerteza

Pois nesse avesso, morrem tristezas,

Nessa beleza, em prematuros, fazem partos

E assim nascerá um novo amor:

Suave, ainda que não tão sutil

De palavras poucas

Entre abraços mil

domingo, 24 de agosto de 2008

Querer amar

eu quero tragar teu cheiro
e me embriagar da tua saliva
eu quero morder teu sorriso
e apagar tuas divisas

eu quero saborear teu choro
e soletrar os meus segredos
eu quero me enrolar em teu corpo
e me esconder em teus desejos

eu quero sussurar meu beijo
e inventar tuas mentiras
eu quero imitar teu jeito
e engolir tua alegria

ver o mundo calado, como eu queria
só te ouvir cantar, e ainda quero
te mostrar a minha dor, a minha agonia
uma menina linda, poder amar, eu espero

quarta-feira, 30 de julho de 2008

Onomatopéias cardíacas

Desde pequeno, sempre me mandaram ouvir “a voz do coração”. Nunca hesitei em seguir esse conselho. Na quietude da noite, lhe escuto. E ele só bate na porta do meu peito e pergunta:


- Tem alguém aí fora?

terça-feira, 29 de julho de 2008

O monstro e o carrasco

No meu velho vício de escrever textos e poesias, nunca, nem sequer no instante de uma rápida reflexão, esperei redigir uma história infantil. O curioso dessas narrativas não consiste exatamente nas suas mensagens, mas na forma como essas mensagens são cuidadosamente elaboradas por seus escritores (em uma tentativa desesperada de, um dia, se tornarem novamente criança).

Hoje, dia 28 de julho de 2008, resolvi escrever o esboço de uma dessas histórias. Quem sabe, assim, eu não possa, aos poucos, me tornar jovem, e depois, ainda mais jovem, vestir o corpo de uma criança (na sua ânsia de descobrir um mundo que ela mesma ajudou a construir)?

Se isso for verdade (com certeza será uma a partir de agora), não desejo que aconteça dentro de uma máquina do tempo que me transporte para o passado. Quero poder ser criança sem voltar a ser a que um dia já fui. Talvez, mesmo se pudesse, não seria. Mas não quero prever o que me aconteça, porque tudo já me aconteceu um dia, no futuro. Não é assim que as crianças são. Portanto, que eu seja criança somente a partir de agora. Quero ser, então, a criança que eu nunca fui (apesar de uma delas já ter sido).

Antes de mostrar uma parte da minha pequena história, gostaria de fazer algumas considerações. Não sei se você (leitor adulto, por isso agora impaciente com a desde o início anunciada narrativa) já parou para ler, depois de grande (e, portanto, chato), a literatura infantil que, um dia, tanto apreciou. Eu já o fiz, e me acredite: pensei eu ter entendido menos agora do que quando meus pais me contaram.

Vejam só que engraçado! Apenas as crianças são capazes de entender a fantasia de textos escritos por nós, adultos. Há coisas que só as crianças entendem e, em seu melhor discernimento, são gradativamente castradas. As pessoas grandes são as grandes responsáveis por tolher a inteligência das pessoas pequenas. Incutem nelas os próprios medos e fobias, não permitem que elas vivam em um mundo sem respostas, porque perigoso. Mas as crianças nos perdoam. As crianças tentam, a cada dia, educar aos seus pais (não ache que você tem filhos para ensinar alguma coisa a alguém, na verdade você também foi, um dia, ensinado a entender para, entendendo, não conseguir entender coisa alguma).

Caro e impaciente leitor, se não consegues, pelo menos por esse breve instante de leitura, se fazer criança, pare por aqui. Aquele que vos fala, a partir do próximo parágrafo, é alguém que, desconhecendo o mundo, entende mais sobre ele do que qualquer um de nós. Ele se chama Thiago, é filho de Jadson e Hermengarda, possui dois irmãos: André, o mais velho, e Natália, a do meio. Estuda na Faculdade de Direito do Recife, onde já sabem de mais, e por ele já não querer saber tanto assim, continua por lá para fazer perguntas óbvias (portanto, irrespondíveis), irritando e educando aqueles que se dizem seus professores. Escreverá esse trecho quando criança, aos mais de 20 anos de idade. Não liguem suas constantes ironias, peço perdão pelo mesmo, desde já.

“Era uma vez um monstro que não chegava a ser feio, mas também não tão bonito. Ele não tinha várias cabeças, nem uma cor diferente das que são encontradas por aí. Fisicamente, não era estranho (pelo menos não o suficiente para ser considerado um monstro a quem se deve temer).

Seus olhos eram castanhos, assim como o seu cabelo. As vezes usava uma barba mal-feita, as vezes não. Era magro e baixo, mas nunca se incomodou com isso. Na adolescência teve espinhas, como todos os outros, mas em maior quantidade.

Apesar da sua aparência comum, ele era mal, muito mal. Não se escondia em uma caverna ou em um buraco, ainda que não tivesse nada contra cavernas e buracos. Visitava alguns amigas e amigos nesses lugares.

Mas, se não se pode dizer que ele era feio ou exageradamente forte, porque monstro, afinal? Apesar de não ser dotado de aparentes grandes poderes, imagine você que ele não temia o mais cruel dos sentimentos que, um dia, já se guardou por alguém: o amor!

Saía por aí, conversando com as pessoas, conhecendo gente nova, veja que absurdo! Não tinha nenhum receio de se apaixonar por elas, e nem pedia que elas a amassem de volta. Se amasse mais, não pedia troco; se amasse menos, não se sentia um devedor. Não sentia culpa por amar o outro, nem mesmo tentava explicar a todo custo o que sentia (como se não devesse explicações do inexplicável). As vezes nem mesmo ele sabia o que sentia, e não se importava. Ao contrário, vivia.

Até hoje, do maior monstro da história da humanidade, só se sabe isso: ele as vezes amou, as vezes foi amado. As vezes amou e foi, também, amado. E amou porque foi amado e era amado porque amou. Sem preocupações, apenas vivia na espera de um novo amor acontecer, cuidando dos mais antigos e desgastados. E tentava fazer com que os outros amassem, se não a ele, a um outro alguém.

O seu maior crime foi dizer, sem vergonha das palavras: “eu te amo!”. Com isso ele enganou, com isso ele foi enganado. Mas, para ele, tanto fez. Morreu como havia de morrer: rodeado de bons amigos e amores inacabados. Sua pena foi póstuma, porque, enquanto vivo, nunca permitiu que, por amor, lhe penalizassem: os juizes proibiram-lhe que seus amados lhe enterrassem, os sinos da Igreja não foram badalados. É considerado um monstro não porque amou, mas porque foi, assim, julgado.

Desde então o amor foi proibido em lei e seus autores devidamente enquadrados no código penal vigente. Alguns poetas tentaram, então, a revolução armada. Foram todos executados pelos fuzis da ditadura.

No epitáfio daquele monstro, se pode ler, como um exemplo indigno de ser seguido “jaz, nesse túmulo, Thiago Cavalcanti. Morreu sorrindo, assassinado por um de seus amores. Amou, também, o seu carrasco”.”

FIM

Aos carrascos que me amaram e aos juizes que fizeram de mim um monstro, dedico a minha primeira história infantil

segunda-feira, 28 de julho de 2008

Meu bem,

Aqui acaba o meu dia de ontem. O sol que me põe para dormir despertará uma data que demorarei a perceber. As estrelas que contava para te encontrar sumiram na claridade, tornaram-se invisíveis de tão evidentes e iluminadas. A lua agora viaja para um lugar qualquer, apressada para tornar insano tantos outros insones que só pensam em não ser. Quando você acordar estarei bocejando um sono leve, o sono inseguro dos amantes inquietos. Espero não chegar novamente atrasado para te desejar bom dia. Que ele o seja, ainda que (e talvez porque) sem mim.


Para aquela que, dentro de mim, adormece (mas acorda sozinha)

quinta-feira, 24 de julho de 2008

Cara solidão,

Desculpe a demora para lhe enviar uma resposta. Andei bastante ocupado durante todos esses dias. Devo, também, pedir desculpas por não ter comparecido ao nosso último encontro. Já havíamos marcado e desmarcado tantas vezes e há tanto tempo. Afinal, explico.

Estive pensando na saudade que sinto de ti. Vivemos bons momentos juntos. Será que agora sentimos medo um do outro? Até pouco tempo não precisava te convidar para uma visita. Éramos como dois grandes amigos. Lembro da última vez que viesses dormir aqui em casa, ao meu lado, me vendo levantar da cama para procurar algo que nunca encontro na geladeira vazia. Eu ia ao banheiro e mirava aquele espelhinho que tu me desses de presente. Sempre me assustei ao ver nele a tua imagem refletida, no lugar da minha. Largava de súbito o objeto e olhava novamente para te observar mudar tantas vezes de corpo, até se transformar no meu que, enfim, podia chorar. Ao voltar para cama, me cantavas algumas canções de ninar e eu adormecia tranqüilo em teus braços. Logo depois, o dia amanhecia. E eu me sentia tão criança quando tentava ficar acordado até a hora de você ir embora, te vigiando para que não fugisses sem despedida, assim como sempre fazia o mal-educado papai noel nas tristes noites natalinas.

Quero, ainda, justificar a minha mais recente ausência. Estive com uma amiga no último sábado. Talvez você também a conheça. Assistimos um filme, conversamos sobre coisas banais. Nos pediram para fazer silêncio, algumas vezes. Eu também faria o mesmo. Sorrimos, gargalhamos. Quando não tínhamos mais motivos, fazíamos cócegas. Ela se foi e eu fiquei, porém, sem ti. Para onde ela terá ido? Não sei. Se você a encontrar, pergunte como foi seu dia, abrace-a, diga que a amo. Não tenha ciúmes porque com ela te traí. Ela saberá, também, te fazer companhia.

Para uma menina linda.

domingo, 29 de junho de 2008

Faculdade de Direito do Recife,

talvez não mereças a poesia que te dedico. És tão tímida e pequenina que exiges de mim certo esforço literário para que caibas em uma. Ou não percebes as grades que te separam do mundo aqui fora? Para que te serve aquela sala cheia de espelhos, agora tão empoeirada, se não enxergas neles a tua imagem própria?

Vista de cá, mal sabes como és feia. Pena que és, também, tão narcisista. Gostaria, um dia, de te levar para passear. Poderia te apresentar aos meus amigos. Conhecer novos rostos te faria, com certeza, muito mais bela. Não, não tenhas medo deles! São velhos camaradas. Pode parecer estranho, mas eles não se vestem assim, engravatados (como aqueles que se dizem teus professores). Andam descalços e sobrevivem de esmola, porque foram roubados. Mendigam sem saber que, aquilo que pedem, na verdade, lhes pertence. A maioria deles possui rostos pintados de cores que jamais olhaste. Sonho com o dia que não lhes levarão para te visitar, como se freqüentassem uma casa que não lhes pertence. Gostaria que eles pudessem morar aí contigo; mas isso, porém, sempre lhes negaram.

Lembro da primeira vez que me vi aí, dentro de ti. Tua arquitetura imponente me fez sentir-me tão pequenino (assim como eu, hoje, te acho). Então voltei mais vezes e vi que, na verdade, para isso fosses feita. Para eu me sentir pequeno diante de um direito que não é meu (nem dos companheiros que nunca, em teus domínios, sequer pisaram).

Que direito passa por ti? Porque não achas que é direito o que se faz aqui fora? E Porque te dizes pública, afinal?

Na verdade, te prostituíste. Deixasse que usassem teu corpo para continuar oprimindo os que nunca te adentraram. Agora és coisa e, na condição de coisa, não podes permitir que todos tenham a ti acesso: essa é a lei do mercado. Estás jogada nas mãos de poucos. Ofereces a eles teu status, e assim te valorizam. És, para eles, moeda de troca. Em breve, eles não mais precisarão de ti, e te entregarão aos oprimidos, como esmola.

Por isso, quero dizer, ainda que agora não me ouças: as grades que te separam do mundo não te protegem. Tuas grades tornam-te fadada à autofagia. Mas pessoas aqui fora não permitirão que te destruas. Elas te estenderão as mãos, mas não para ocuparem esse espaço de hegemonia: querem elas destruir teus portões, apagar essa linha invisível que te divide do mundo. Estarão aí dentro mesmo que daqui de fora, porque inexistirão esses conceitos...

E só então te farás bela!